DIRETORES ASSOCIADOS

Angela Pieruccini
pieruccini@parceiros-consulting.com
Emmanual Gavache
gavache@parceiros-consulting.com

quarta-feira, setembro 08, 2010

A ARTE DA GUERRA: UMA ESTRATÉGIA EMPRESARIAL







A palavra estratégia deriva do termo grego strategos, que combina stratos (exército) com ag (liderar). Assim, strategos significa literalmente «a função do general do exército». Uma vez que o conceito de estratégia teve origem no meio militar, é importante identificar similaridades que ainda existem entre a formulação de uma estratégia militar e empresarial, tanto ao nível dos objetivos como da natureza das análises, bem como dos resultados.

Quanto ao objetivo, uma estratégia militar visa a conquista e controle de territórios, enquanto a empresarial reside na conquista e controle de mercados. Se a estratégia empresarial analisa a estrutura da indústria, os pontos fortes e fracos da empresa, o tipo de organização e de liderança e os estudos de mercado, a estratégia militar analisa as condições climáticas e do terreno, a distribuição de forças e a estrutura de comando. E se na estratégia militar o resultado é o plano de campanha, na empresarial é o plano estratégico.

O estudo do planejamento militar fornece pistas valiosas para o desenvolvimento da estratégia empresarial. É útil relembrar os ensinamentos do clássico A Arte da Guerra, o tratado de estratégia militar mais antigo do mundo, escrito entre 400 e 320 A.C. pelo chinês Sun Tzu.

Sobre a finalidade da guerra, Sun Tzu escreve que «o objetivo é capturar o território do inimigo intacto; a vitória só será completa se as nossas tropas não forem afetadas». Em relação à oportunidade da guerra, Sun Tzu elucida que «não se entra em guerra sem certeza da vantagem, não se usa as tropas sem certeza da vitória e não se luta sem estar em perigo».

Sobre as maneiras de condução da guerra, Sun Tzu advoga o domínio do inimigo sem luta direta, capturar as suas cidades sem assaltos violentos e conquistar seu território sem operações prolongadas». Em suma, para Sun Tzu, a guerra não deve implicar o derrame desnecessário de sangue, tal como, para os bons executivos, a gestão não deve envolver o uso desnecessário de recursos. Tanto os planos estratégicos empresariais como militares devem cumprir os objetivos propostos com o mínimo de custos e o menor espaço de tempo possível.

O raciocínio do sábio Sun Tzu é particularmente interessante na priorização das estratégias ofensivas.

«A melhor estratégia é atacar a estratégia do inimigo.» Lição de gestão: as empresas devem ser as primeiras a entrar nos mercados e agir de forma pró-ativa. Por exemplo, a Lever conseguiu adiar durante anos a entrada em Portugal da rival Procter&Gamble, através do constante lançamento de novos produtos para dominar todos os nichos do mercado de detergentes.
«A segunda melhor estratégia é destruir as alianças do inimigo.» Lição de gestão: as empresas devem isolar a concorrência e estabelecer alianças. Por exemplo, a aquisição da ICL pelo rival japonês Fujitsu contribuiu para desmembrar um consórcio europeu de pesquisa na área das novas tecnologias de informação.
«A terceira melhor estratégia é atacar as tropas do inimigo.» Lição de gestão: as empresas devem recrutar quadros da competição ou comprar os concorrentes. Por exemplo, o BCP contratou alguns dos melhores dirigentes do BPA e, mais tarde, adquiriu o rival.
«A pior estratégia consiste em atacar cidades fortificadas.» Lição de gestão: as empresas devem evitar segmentos já dominados ou com baixo crescimento. Por exemplo, a entrada no negócio da distribuição de gasolina é não é aconselhada para empresas sem experiência no setor, em virtude da posição dominante que as multinacionais e os produtores nacionais já alcançaram.

Prosseguindo, para nosso sábio chinês a formulação de uma estratégia deve respeitar quatro princípios fundamentais.

Princípio da escolha do local de batalha. Segundo A Arte da Guerra, os estrategos devem escolher o campo de batalha em função das suas vantagens distintivas: «O bom general traz o inimigo para onde quer lutar», ou seja, a empresa deve atrair os rivais para os mercados onde sua posição competitiva é mais forte.
Por exemplo, a Pepsi explorou o fato da sua bebida conter mais açúcar do que a Coca-Cola, para lançar a campanha publicitária «Provas de sabor Pepsi», baseada em testes cegos, já que as pessoas preferiam o refrigerante mais doce.

No caso de não se possuir uma vantagem distintiva, Sun Tzu aconselha uma escolha do campo de batalha ignorado pelo inimigo: «Deve-se atacar onde o inimigo não defende ou a sua defesa é fraca», ou seja, a empresa menos forte deve posicionar-se nos nichos de mercado mal servidos pela concorrência.
Por exemplo, a European University optou por oferecer programas de licenciatura e de mestrado em língua inglesa, evitando o confronto direto com as universidades já estabelecidas.

Porém é essencial evitar combater nos terrenos próprios, mesmo possuindo vantagens distintivas: «Em terreno próprio deve-se unificar o exército e não lutar», o que significa que a empresa deve fortalecer as suas posições nos mercados próprios e crescer nos mercados dos concorrentes.
Por exemplo, para assegurar a liderança mundial no setor do equipamento para a construção civil, a norte-americana Caterpillar criou uma joint-venture para competir no Japão, o mercado principal do seu maior concorrente, a Komatsu. Desta forma a Caterpillar prejudicou as vendas da rival no Japão e minorou as hipóteses da Komatsu contra-atacar no seu próprio mercado, os Estados Unidos.

Princípio da concentração de forças. A Arte da Guerra defende que, para assegurar a vitória, as forças devem ser concentradas nas áreas de fraqueza do inimigo: «A força de um exército não depende do número de tropas. Se o inimigo reforçar o lado direito, o esquerdo será vulnerável; se tentar proteger todas as frentes, será fraco em cada uma delas.» Logo, quando ataca, a empresa deve concentrar os seus recursos nas áreas de fraqueza relativa dos concorrentes.
Por exemplo, na batalha pela conquista do horário nobre da televisão, a emissora privada SIC cativou as audiências exibindo telenovelas brasileiras da Globo de qualidade reconhecida, em confronto direto com as telenovelas portuguesas da emissora estatal RTP.

Por outro lado, a disposição das forças próprias deve ser secreta para forçar o inimigo a dispersar as suas: «Se conseguir descobrir a disposição do inimigo e esconder a sua, é possível concentrar energias enquanto ele as divide.» Ou seja, a empresa deve estudar com cuidado a atuação da concorrência e esconder os seus planos e ações.
Por exemplo, a aquisição do construtor britânico Rover pela rival alemã BMW apanhou de surpresa a generalidade dos competidores na indústria.

O recurso à contra-informação também contribui para enganar o inimigo e ganhar uma vantagem relativa: «Todas as guerras são baseadas em mentiras. O inimigo não deve saber onde vai ser atacado.» Isso significa que, na medida do possível e eticamente aceitável, a empresa deve enviar sinais incorretos aos seus concorrentes para ilusão dos mesmos.
Por exemplo, para tentar limitar as vendas do sistema operativo OS/2 Warp da IBM, a Microsoft anunciou repetidas vezes, durante um ano, o lançamento iminente do seu produto concorrente Windows 95. Desta forma, conseguiu persuadir muitos clientes pela espera do seu próprio sistema antes de tomar a decisão de compra.

Princípio do ataque. Paradoxalmente, A Arte da Guerra não faz apologia da confrontação direta. Pelo contrário, Sun Tzu defende que a batalha deve ser evitada sempre que possível. Se, porém, o confronto for inevitável, a vitória caberá, em regra, ao atacante: «Quem puder ganhar, deve atacar. Se não puder alcançar a vitória, deve defender.» Ou seja, as empresas melhor posicionadas devem tomar as iniciativas de ataque.
Por exemplo, embora o fabricante de produtos de eletrônica de consumo nipônico Sharp seja o maior produtor mundial de ecrãs de cristais líquidos, o seu investimento em novas tecnologias e em unidades industriais neste negócio é todos os anos superior ao dos seus principais concorrentes.

Em qualquer circunstância, o ataque deve maximizar os ganhos e minimizar as perdas: «O auge da competência é conquistar o inimigo sem lutar. Quando as campanhas são longas, esgotam-se os recursos do Estado.» Significa que a empresa deve avaliar cuidadosamente os benefícios e custos das suas iniciativas e agir com rapidez e seletividade.
Por exemplo, quando o construtor de equipamento elétrico Asea se associou ao rival Brown Boveri para formar a ABB, foi criada uma comissão especial de gestores para decidir, em poucos meses, quais os diretores das filiais internacionais a ser mantidos ou dispensados. Desta forma, foi possível eliminar rapidamente os custos de estrutura redundantes e aproveitar o potencial sinergético da atuação conjunta nos mercados mundiais.

Por outro lado, a análise das forças relativas determina a natureza do ataque a efetuar: «Quando exceder o inimigo em 10 para 1, deve cercá-lo. Quando exceder o inimigo em 5 para 1, deve atacá-lo. Quando exceder o inimigo em 2 para 1, deve dividi-lo. Quando for igual ao inimigo, deve decidir se deseja lutar. Quando o inimigo for um pouco superior, deve ser capaz de fugir. Quando o inimigo for muito superior, não deve enfrentar.» O que significa que as iniciativas atacantes da empresa devem avaliar as capacidades defensivas da concorrência.
Por exemplo quando, no início dos anos 80, a liderança do fabricante nipônico de motorizadas Honda foi posta em causa pela rival Yamaha, o seu ataque foi fulgurante. Em apenas 18 meses lançou no mercado doméstico 81 novos modelos de motorizadas, o triplo das novidades introduzidas pela concorrente no mesmo período de tempo. Em simultâneo, reduziu os preços médios em cerca de 30%, mantendo ainda assim margens de comercialização para os seus distribuidores 10% superiores às da Yamaha. Face à superioridade relativa dos seus recursos, a Honda optou por atacar diretamente a rival, ditando o desfecho da batalha: em menos de dois anos, a quota de mercado da Honda passou de 38% para 43%, enquanto a posição da Yamaha resvalou de 37% para 23%.

Não basta contudo analisar a quantidade dos recursos da concorrência, a qualidade relativa também é importante: «Nunca avançar apenas com base na quantidade das forças. Quando atacado por um inimigo superior em número, deve-se capturar o que ele mais valoriza», o que significa que uma empresa em inferioridade numérica deve concentrar sua atuação nos segmentos mais atrativos do mercado.
Por exemplo, a consultora norte-americana McKinsey especializou-se no segmento da consultoria estratégica para grandes organizações, onde conseguiu estabelecer uma sólida reputação, que lhe assegura elevadas taxas de crescimento e rentabilidade em escala mundial.

Princípio das forças diretas e indiretas. Finalmente, A Arte da Guerra chama a atenção para a importância de utilizar as forças próprias de uma forma flexível para vencer as batalhas: «As forças diretas são utilizadas no combate com o inimigo, mas são as forças indiretas que asseguram a vitória. As combinações entre forças diretas e indiretas são infinitas.» Isto significa que a empresa deve adequar constantemente sua atuação às condições competitivas do mercado, utilizando seus diferentes tipos de recursos com flexibilidade.
Por exemplo, quando, em meados dos anos 70, ocorreu a primeira crise do petróleo no Médio Oriente, a empresa distribuidora de produtos petrolíferos Shell reforçou rapidamente os seus investimentos na exploração de novas fontes de matéria-prima no mar do Norte e nas atividades de extração e refinação, em detrimento da expansão da rede de estações de gasolina. Desta forma, conseguiu ultrapassar antes dos concorrentes o período recessivo e ascender à liderança global do setor.

Então, a Gestão do Negócio pode ser chamada também de Arte da Guerra?

PARCEIROS-CONSULTING

2 comentários:

  1. Evidentemente, como em qualquer processo de estabelecimento de similaridades, nem tudo no mundo dos negócios pode ser resolvido por Sun-Tzu e seus conceitos.
    Porém é uma importante obra de conhecimento e referência, sendo que muitos dos seus preceiros "militares", realmente são comparáveis à situação empresarial, dentro sem dúvida de limites morais e éticos.
    Muitos anos depois, parece que os grandes teóricos, seja em qualquer dominío, ainda são os antigos, mostrando que nos falta, hoje, muita pesquisa e criação de conhecimento. Porquê?

    ResponderExcluir
  2. Estou lendo o livro a arte da guerra e nao compreendia muito bem, com esse link ja entendo melhor

    ResponderExcluir